sexta-feira, 10 de abril de 2015

Gustavo Krause - Escrito em 06/04/2015 - 09:57 Este é o título da magnífica obra cujo autor foi e continua sendo um dos mais influentes pensadores do século XX. Gigantesca no tamanho e apurada na qualidade, a produção intelectual de Russell Kirk (1918-1994, nascido em Michigan) nos deixou 3.000 artigos de opinião, 814 artigos acadêmicos, 255 resenhas de livros, 68 prefácios, 23 coletâneas de ensaios, 3 romances e 22 contos reunidos em 6 livros. A Política da Prudência (1953) reúne 18 conferências ministradas na Heritage Foundation, editada antes do seu falecimento e lançada no Brasil pela È Realizações Editora, Livraria e Distribuidora Ltda, em 2014. A pergunta é inevitável: por que um autor de tão vasta e importante obra somente agora é editado no Brasil? Se fosse brasileiro, Kirk não teria uma trajetória reconhecida merecidamente pelo simples fato de ser conservador, embora o mais notável descendente da prole cujo pai é o irlandês Edmund Burke (1729-1797, autor do clássico Reflexões Sobre a Revolução em França, Brasília: Editora Universidade de Brasília, 2ª Ed. 1997). Conservador? No Brasil, a sub-cultura política tem aversão ao debate. Prefere substituir o embate das ideias por uma rinha de galos de briga. As rotulagens pejorativas buscam desqualificar os debatedores. Kirk seria acusado de imobilista, reacionário e, no limite, associado à direita truculenta e autoritária. Não faltaria o troco, não por parte de Kirk que era, sobretudo, um gentleman. Porém, os autores das acusações escutariam a réplica idiota: comunistas, stalinistas e outras etiquetas “ofensivas”. Pois bem, a abertura intelectual de Kirk e sua virtuosa tolerância o fizeram admirado pelos que discordavam de suas ideias. Não faltaram convites para integrar governos republicanos e democráticos. Convidado por Ronald Reagan, deu uma resposta bem-humorada: “como você deve me odiar para tentar me transformar num burocrata”. Com efeito, Kirk preferiu remar contra a maré e apontava com sólida argumentação na direção de “negação de ideologia” e do “consenso liberal americano”. Sobre ideologia, afirmava: (...) A ideologia não significa teoria ou princípio (...) Inverte as religiões (...) O que a religião promete ao fiel numa esfera além do tempo e do espaço, a ideologia promete a todos na sociedade – exceto aos que forem liquidados no processo”. De outra parte, no seu livro A Mente Conservadora, prestes a ser lançado no Brasil, Kirk emitiu um tom inteiramente dissonante sobre o consenso liberal americano seja a visão do liberalismo clássico, seja a visão do “liberal” significando a tendência mais à esquerda “progressista”, não marxista. A partir da lógica conservadora, ele enumera os seis cânones da doutrina, aqui, expostos resumidamente: (I) A crença em uma ordem transcendente, ou corpo de leis naturais que rege a sociedade, bem como a consciência; (II) Defesa da prolífera variedade e mistério da vida humana em oposição à uniformidade limitada, ao igualitarismo e aos propósitos utilitários dos sistemas radicais; (III) A convicção de que a dinâmica de uma sociedade civilizada requer ordem e classes em oposição à noção de uma “sociedade sem classes”; (IV) Propriedade e liberdade estão intimamente relacionadas e a supressão de um desses pilares da sociedade abre espaço para o Leviatã absoluto e para a utopia da igualdade econômica que não significa progresso econômico; (V) Resistência aos projetos abstratos de sociedade, obra de “sofistas, calculistas e economistas”, opondo como freio, os costumes, a convenção e usos consagrados; (VI) Obedecer aos ditames da prudência, a maior virtude do político, diante da mudança caracterizada como inovação precipitada que produz a conflagração em vez da tocha do progresso. A rigor, a essência do pensamento kirkeano não pode se compreendida como uma doutrina política, mas como um estilo de vida, forjado pela educação e pela cultura. Todavia, é procedente afirmar que, no campo das ideias e das práticas políticas, os seguidores do conservadorismo kirkeano se opõem às mudanças radicais, revolucionárias, à perfeição das utopias, adotando uma visão realista, gradual, progressiva propondo a reforma como caminho inovador e transformador. É, em síntese, um moderado diante da fúria dos extremos e das sequelas das rupturas. Por aqui, seria acusado de reacionário e, decerto, responderia com a fina ironia de Nelson Rodrigues: “Sou reacionário. Reajo a tudo que não presta”.

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